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Inclusão da Capatazia nos tributos da importação - Ilegalidade pretérita, desde 2009, revelada no introito da IN RFB nº 2090/2022
IN n. 2090/2022 - Fundamento de validade para a retirada da capatazia da base de cálculo dos tributos da importação, a Decisão Mercosul nº 13/2007 (Decreto nº 6.870/2009), já determinava essa exclusão desde 2009.
Analiso, neste pequeno artigo (resumo de sua versão acadêmica, ainda sob o escrutínio de sua publicação), a capatazia e o valor aduaneiro, mas com um fato novo, nunca antes referido pelas discussões sobre a matéria, e isso porque o mesmo foi propositadamente omitido de todas as manifestações da Receita Federal e da União Federal em processos sobre o assunto, até 2022, o que deve gerar a revisão da tese, firmada em sentido desfavorável aos contribuintes, no Tema Repetitivo nº 1.014 do Superior Tribunal de Justiça, por maioria de apenas 1 voto e ainda pendente de análise de embargos de declaração naquela Corte.
Com efeito, foi revelado, somente no introito da Instrução Normativa nº 2.090/22, um fundamento legal nunca antes referido pela Receita Federal ou pela Procuradoria da União Federal (em suas respostas de consultas tributárias ou em quaisquer de suas manifestações sobre o assunto em processos), e, até por isso, também jamais analisado por qualquer julgado sobre a matéria, nem mesmo pelo Superior Tribunal de Justiça.
Esse fundamento legal é a Decisão normativa do Mercosul 13/2007, internalizada, com o status de lei ordinária em nosso sistema jurídico, pelo Decreto nº 6.870, de 4 de junho de 2009[2].
Tal tratado internacional expressamente excluiu a capatazia nacional do valor aduaneiro, ao definir, de forma inequívoca, o momento da incidência do fato gerador dos tributos devidos na importação, como sendo a chegada da mercadoria importada ao seu destino final, e não o despacho aduaneiro (somente final do processo de liberação), como sempre defendeu a Receita, pondo, assim, fim a qualquer divergência sobre o assunto. A mesma decisão normativa do Mercosul também expressamente estabeleceu que deveriam ser excluídas do valor aduaneiro todas as despesas incorridas em território nacional, posteriormente à essa mencionada chegada da mercadoria ao seu destino.
Naquele momento, então, o Estado Brasileiro expressamente declarou, em compromisso internacional com os seus parceiros do Mercosul, posteriormente ratificado e assim incorporado ao ordenamento jurídico nacional, que não se pode, ao menos desde 2009, cobrar tributos de importação sobre grandeza diversa do valor das mercadorias importadas, acrescidas das despesas de frete e seguro, até o porto, o que exclui as despesas incorridas no território nacional com a capatazia.
O próprio Ministério da Economia reconheceu isso, em Nota Técnica SEI nº 2477/2021/ME[3] (que justamente antecedeu e fundamentou a redução promovida por Decreto e a respectiva IN regulamentadora, de 2022), quando aduziu à ilegalidade da cobrança sobre o valor da capatazia nacional, em seu parecer jurídico incluído em tal nota. E isso foi feito sem prejuízo e a despeito do declarado conhecimento da fixação da tese, em sentido contrário (ou seja, favorável ao Fisco), pelo STJ, no Tema Repetitivo 1.014 do STJ, de 2020. E por conta dessa ilegalidade reconhecida e dos malefícios que a mesma gera, para a economia do país, como destacado em seu parecer econômico, o mesmo Ministério aponta a necessidade de adaptação da legislação interna, para a adequação, inclusive, aos compromissos/ tratados internacionais firmados pelo Brasil. Esse parecer/recomendação foi enviado à Receita Federal, a qual, em junho de 2022, o acatou, mas somente prospectivamente, ou seja, somente para importações futuras.
Pretendeu, assim, o Poder Executivo, limitar a sua responsabilidade de devolver o que reconhecidamente cobrara indevidamente, desde a vigência da norma de 2009, a que ele mesmo se reporta, como fundamento de validade do fim da cobrança de tributos na importação sobre a referida capatazia.
Por conta disso, entendo e defendo ser necessária revisão do Tema Repetitivo nº 1.014 do Superior Tribunal de Justiça, fixado em março de 2020 (e que se encontra pendente de análise de embargados declaratórios, até hoje), mediante a análise da questão aqui debatida sob a lente da verdade, revelada por esse autêntico fato novo, de 2022, e do princípio da boa-fé objetiva, ao qual está jungida a Administração Tributária, por força do artigo 37 da Constituição Federal, além da necessária revisão de ofício, e retroativamente, de atos ilegais praticados pela Administração, a qual não pode se valer da própria torpeza, por ela mesma recentemente revelada, como nos ensinaram, no canal TribContCAST, os professores Jimir Doniak Junior e Thais De Laurentiis.
[1] Tradução livre da frase “the best way to hide something is in plain sight”, Poe, Edgar Allen. “The Purloined Letter” in The Works of Edgar Allan Poe. New York: Harper and Bros. 1910
[2] Decreto 6.870/2009 e seus ANEXOS https://www.diariodasleis.com.br/legislacao/federal/211220-decisues-do-conselho-do-mercado-comum-dispue-sobre-a-viguncia-de-decisues-do-conselho-do-mercado-comum-resoluuuo-do-grupo-mercado-comum-e-de-diretrizes-da-comissuo-de-comurcio.html consultado em 30/09/2024
[3] https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/03/sei-19687-100387-2021-92-1.pdf consultado em 30/09/2024